segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Relato de Caso


Relato de caso


O paciente é um homem português de 40 anos de idade, que iniciou consumos de cannabis e álcool aos 22 anos, heroína aos 23, e consumos injetáveis, com partilha de material, aos 25. Com a evolução do quadro, o paciente passou a consumir apenas heroína, diariamente. Em 1997, iniciou terapêutica de manutenção com L-a-acetilmethadol (LAAM) em ambulatório público para tratamento da toxicodependência, onde ainda permanece, e foi diagnosticado como portador do vírus HCV. Até então, teve diversas consultas psiquiátricas apenas para o tratamento da toxicodependência, sem outro diagnóstico. Entre 2001 e 2004, o paciente permaneceu abstinente por 2 anos e 4 meses, o que foi comprovado por análises de urina. Durante acompanhamento psiquiátrico em consequência de alterações do humor (insônia, falta de energia, apatia, baixa auto-estima, desesperança e dificuldades para tomar decisões), diagnosticou-se distimia. O tratamento da toxicodependência foi trocado para cloridrato de metadona em razão dos riscos de tratamento com LAAM, que foi abolido em todo Portugal. O paciente manteve quadro de humor estável com o uso de trazodona, paroxetina, lorazepam e oxazepam. Em 2004, iniciou tratamento para hepatite C com interferon e foi diagnosticado como portador do vírus HIV. Tanto o tratamento com interferon quanto o conhecimento da infecção pelo HIV levaram à piora do quadro mental e o paciente apresentou recaída em opioides e álcool. Nessa nova fase, o paciente bebia mais de 30 unidades de álcool por dia, recaiu em consumos injetáveis de heroína e metadona (com partilha de material) e apresentava humor deprimido e afeto hipomodulante. Ele foi medicado com venlafaxina XR 150 mg/dia e metadona 85 mg/dia. Infelizmente, o paciente abusava dos medicamentos, ingerindo diversos comprimidos ao mesmo tempo, junto com bebidas alcoólicas. Como não houve melhora do quadro com a medicação e em virtude da desorganização apresentada pelo paciente, optou-se por nova proposta terapêutica com clomipramina 75 mg/dia, olanzapina 10 mg/dia, alprazolam 3 mg/dia e metadona 105 mg/dia e iniciou-se uma proposta integralista com apoio de psicoterapia, consultas de enfermagem, psiquiátricas e de serviço social: os comprimidos eram tomados pela manhã, com a dose de metadona, em frente a um profissional da enfermagem, que a seguir fornecia os comprimidos da noite para o paciente levar para casa. A abordagem em psicologia foi reestruturada para consultas mais breves, de cunho cognitivo e comportamental, e o paciente teve de aceitar um novo esquema de consultas com o serviço social. Este último teve como base o fato de que o paciente comparecia diariamente à instituição, solicitando consultas sociais, com o objetivo de chamar atenção para sua solidão e problemas financeiros. O paciente manteve-se abstinente de heroína e álcool (comprovado por exames de urina) com essa nova proposta terapêutica, apresentando melhora do humor, mas sem melhora das condições sociais.


Relato de caso retirado do artigo: Comorbidades entre dependência química, distimia, HIV e HCV: relato de caso; da Revista de Psiquiatria Clínica, Rev. psiquiatr. clín. vol.36 no.1 São Paulo 2009.

Um comentário:

  1. Ola...estava a navegar e encontrei o artigo que escrevi no seu blog. Fico feliz de ver que as pessoas discutem o que escrevi!
    Felicidades

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